12 janeiro, 2009

O Mel feito no Sol...

A produção do mel começa a milhões de quilómetros do planeta Terra, mais precisamente no Sol. Os raios solares percorrem toda essa distância à velocidade da luz, atingem as folhas das plantas e provocam uma reacção fotoquímica onde se formam moléculas de açúcar. Por sua vez, as abelhas recolhem esse açúcar nas flores e transformam-no em mel.

Mas vamos mais devagar, o que se passa de facto nas folhas das plantas que lhes permitem receber a luz solar e produzir açúcares?

Comecemos por observar uma célula, unidade estrutural dos seres vivos, uma célula vegetal e algumas peculiaridades que a caracterizam...
Uma das características que mais a distinguem das células animais é a presença de determinadas estruturas verdes, móveis e designadas por Cloroplastos. Os Cloroplastos possuem no interior as famosas moléculas de Clorofila, que conferem a cor verde às plantas e cuja abundância é tal que podem ser vistas do espaço.

A Clorofila é então a responsável por essa “magia” de converter o Dióxido de Carbono (CO2) atmosférico e a Água (H2O), em Açúcares (C6H12O6) que são armazenados na planta, e Oxigénio (O2) libertado na atmosfera. Claro que a energia deste processo é proveniente do Sol, sob a forma de radiação luminosa. A este processo, só conseguido pelas plantas verdes e pelas algas, chamamos FOTOSSINTESE.


Os Cloroplastos são micro-fábricas que quase tocam a perfeição, os computadores e máquinas mais evoluídas construídas pelo Homem pouco mais são que “machados de pedra lascada”, quando comparados com a complexidade e eficácia de tais estruturas biológicas.
O açúcar produzido na Fotossíntese, normalmente sob a forma de Glicose e outros açúcares simples, é armazenado na planta em açúcares mais complexos como a Celulose e o Amido. Um desses açúcares é a Sacarose, muito comum no néctar recolhido pelas abelhas.
A Sacarose, constituinte da seiva das plantas, é canalizada para estruturas especificas e localizadas nas flores, os NECTÁRIOS.

Essa seiva, com muita humidade entre outros constituintes, (Néctar), é disponibilizado pelas plantas para atrair as abelhas, funcionando como “moeda de troca” para um “serviço” prestado por estes insectos: a POLINIZAÇÃO.
Na imagem seguinte, repare-se na “armadilha” montada pela flor de Alecrim, Rosmarinus officinalis: quando a abelha pousa para recolher o néctar há uma estrutura carregada de pólen que lhe vai tocar nas costas.

As abelhas recolhem então o néctar que transportam para a colmeia, mas que não podem armazenar por causa do excesso de humidade. Para que esses açúcares possam ser armazenados para a estação fria, deve ser-lhe reduzida a humidade até menos de 20%, o que as abelhas conseguem fazendo descer uma gota de néctar pela língua, expondo-a ao ar e fazendo passar essa gota de abelha em abelha. Entretanto outras abelhas, a bater as asas, renovam o ar húmido do interior da colmeia, substituindo-o por atmosfera mais seca.
Durante este processo, que antes fazia parte do “segredo da abelha”, não só é retirado o excesso de humidade ao néctar, como também sofre uma pré digestão, são-lhe adicionadas enzimas e a Sacarose é desdobrada em Frutose e Glicose, tendo como resultado: o MEL.

Idealmente, as coisas deviam processar-se dessa forma, mas, a dita reacção química não é completa. Nem toda a Sacarose é desdobrada em Frutose e Glicose, surgindo também no produto final, ou seja, no mel.

Isto não tem qualquer importância para o mel, ou melhor, não tinha. Até que há uns anos atrás ao serem analisados alguns lotes de mel de Rosmaninho (Lavandula spp.), se percebeu que excediam os limites do teor de Sacarose permitidos na lei:

Mel Geral ..................... 5g/100g
Mel de Acácia/Luzerna/Citrus spp........10g/100g


Como tal, rotulou-se o mel de Rosmaninho como sendo adulterado.
Seguiram-se estudos para perceber o que se passava com o mel de Rosmaninho, e concluiu-se que mesmo em condições naturais, os índices de Sacarose eram muito superiores ao permitido por lei. Segundo A.G. Pajuelo (comunic. pessoais), durante a floração do Rosmaninho, a entrada de néctar é tão grande (Ver PICO DE PRODUÇÃO DO ROSMANINHO 05/01/2008) que as abelhas não conseguem completar a “pré digestão” da Sacarose do néctar, vindo esta a surgir em maior quantidade no produto final: o mel de Rosmaninho.
Nessa fase, com tal disponibilidade de néctar, a única “preocupação” das abelhas é de facto recolher e armazenar rapidamente a maior quantidade possível.
Com a conclusão dos referidos estudos a legislação foi alterada para:

Mel Geral ....................... 5g/100g
Mel de Acácia/Luzerna/Citrus spp......... 10g/100g
Mel de Lavandula spp. (Rosmaninho)....... 15g/100g


Disto tudo ainda ressalta um facto interessante: conhecida a Fotossíntese realizada pelas plantas, repare-se na fórmula geral, simplificada, da Respiração dos animais:
É fácil perceber que cada processo é complementar do outro, os produtos da Fotossíntese são os substratos da Respiração e vice versa. Assim percebemos a interdependência entre animais e plantas, a importância desta últimas para o equilíbrio ambiental e o contributo das abelhas na reprodução/manutenção do coberto vegetal.
Claro que as plantas também respiram (consomem), mas é largamente compensado com o que produzem.

6 comentários:

Mário disse...

Que grande aula de ciências, pelo que li veio a reforçar a pequena ideia que tinha da coisa, parabéns.

Mel Fonte Nova disse...

ó eng.Pifano este blog acaba por dar mais formação do que 10 desses cursos que são dádos por aí, ou melhor complementa-os , e de que maneira

Abelha Preguiçosa disse...

Cloroplastos...
já não ouvia falar disto há séculos!

No meu caso fico com a impressão que as abelhas acabam por se dedicar mais às marcavalas (Echium lusitanicum ou Echium vulgare, não sei bem) que ao rosmaninho.
Se calhar ainda têm mais sacarose as Marcavalas!? :-)
Em determinada altura as flores são coincidentes...

Alien disse...

Ricardo,

Marcavalas = soagem?

se é isso, o Echium que temos aqui é o E. plantagineum, acho...

Abelha Preguiçosa disse...

Sim, por aqui chamam isso Marcavalas.
Mas pelas fotos que tenho visto este que existe por aqui não é o Echium Plantagineum.
Quando começa a florir o rosmaninho já tem abelhas há algum tempo, e talvez por isso não seja fácil conseguir um mel monofloral de Rosmaninho, pelo menos em muita quantidade...
Estou mais virado para que este seja o E. lusitanicum ou E. vulgare, mas também não é uma questão que me tire o sono!
Abraço

LUIS PALMA disse...

É sempre bom relembrar uma matéria tão importante como esta da obtenção de energia por parte das plantas e dos dos animais que se complementam uma a outra. É pena que muita gente não perceba isto e a importancia que as abelhas principalmente tem no equilíbrio ecológico de todos os ecossistemas.